Desejo
Traiçoeiro
CAPÍTULO 1
- Conhecia-la, não? Quinn hesitou um pouco.
- A minha mãe, sim - corrigiu rapidamente, consciente de
que aquela diferenciação não era muito convincente. Claro que a conhecia e
bastante melhor do que aquilo que gostaria de recordar. No entanto, aquele
assunto não era da alçada de Hector Pickard. E, se dependesse de si, jamais o
seria.
- Há quanto tempo é que isso aconteceu?
Hector mostrava-se insistente, o que fez com que Quinn se
levantasse e se dirigisse à janela, numa atitude indolente. As altas torres de
Canary Wharf, que se avistavam ao longe por detrás dos vidros daquele elegante
gabinete, não eram propriamente o que se via dali.
- Oh, há anos - respondeu finalmente. - Pelo menos, há
dez anos. Foi muito antes de toda aquela confusão com a Intercontinental. Não
tenho a mínima ideia do que possa estar a fazer agora - calou-se por breves
segundos. - Simplesmente desapareceu do mapa.
- Eu sei.
- O que é que sabes?
- Sei onde é que está. Ou, pelo menos, acho que sei
disse, encolhendo os ombros. - Sim, tenho quase a certeza absoluta.
Aquela declaração, que deixava transparecer uma certa
firmeza por parte de Hector, fez com que Quinn se virasse e o olhasse,
incrédulo.
- Onde? Como é que sabes?
- Bem, tenho alguns contactos - contestou Hector, respondendo
à segunda pergunta. - Tu não és o único jornalista que trabalha para mim,
Marriott. Por outro lado, posso-te garantir que alguns deles fariam qualquer
coisa para te destronarem do maravilhoso cargo que ocupas, incluindo a
divulgação de uma ou outra informação confidencial, se isso os levar onde
querem chegar.
- Continua - insistiu Quinn, franzindo o sobrolho.
- A série que estamos a projetar não tem futuro e tu
sabes disso perfeitamente! - exclamou com firmeza. Quem é que apareceu até ao
momento? Dois atores insossos, cujas carreiras declinaram há muito, um jogador
de boxe que já saiu de circuito e que não sofreu tanto no ringue como afirma e
um trio de políticos, cujas proezas sexuais não interessam a ninguém.
- Que Deus me livre dos produtores ambiciosos!
- Não é preciso pores esse ar tão moralista, Marriott.
Sei que criticaste este projecto antes mesmo dele ter começado...
- A verdade é que não era muito original, não te parece?
- mas isso não te absolve de uma parte da
responsabilidade quanto ao seu fracasso.
- Hector, até a rapariga que nos prepara o chá te poderia
ter dito que a apresentação é horrível.
A expressão de Hector evidenciava alguma tristeza. A
série da qual estavam a falar tinha a sua assinatura e, embora admitisse que
Quinn nunca tinha aprovado o projecto, não queria que ele se afundasse. Quinn
não era um homem muito temperamental, bem pelo contrário, era um homem capaz de
mostrar a sua agressividade em algumas ocasiões e aquela era uma delas.
- Talvez devesse ser ela a ocupar a minha cadeira ou, se
calhar, tu. Não serias o primeiro ajudante de produção a pensar que é melhor do
que os outros.
- Não disse nada disso - Hector tinha sido muito bom com
ele e não tinha vontade alguma de estragar a amizade que existia entre eles. -
Apenas acho que devemos abordar o tema de uma forma diferente. O fato de
investigar a vida privada de pessoas que tu próprio admitiste serem simples
nomes do passado, não vai atrair a atenção do espectador.
- Não concordo - para infelicidade de Quinn, Hector ainda
não estava preparado para se dar por vencido. Bem, reconheço que os rostos que divulgamos
até agora não cativaram o público. A segunda série vai ser muito melhor. Não
podes negar que as pessoas iriam gostar de conhecer a vida de Marilyn Monroe,
suponhamos, caso continuasse viva.
- Mas Marilyn Monroe está morta. É por isso que
continua a ser notícia - acrescentou num tom suave.
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